Reflexão do Evangelho - Domingo, 06 de maio


Reflexão do Evangelho -  Domingo, 06 de maio
Jo 15, 9-11 - Vós sois meus amigos.


      Da comunhão íntima e progressiva com Deus, flui uma corrente de amor que age em nós e nos permite conviver com todo aquele de quem nos aproximamos, pouco importam sua crença, sua etnia, suas ideias. Por outro lado, o próprio Mestre nos fala sobre o “ser amigo”, de um modo que realmente nos surpreende: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos”.
Comunhão com Deus! O Êxodo, a longa peregrinação que levou o povo hebreu à Terra Prometida, tornou-se tipo do itinerário cristão para Deus. Alguns escritores, como Orígenes, consideravam a visão luminosa de Moisés, na sarça ardente, como o momento supremo da experiência de Deus; outros viam aquele evento como início de um extenso caminho que conduzia Moisés até à nuvem do Sinai, imagem da perfeita união com Deus.
Assim pensava S. Gregório de Nissa, para quem o ingresso na nuvem luminosa simbolizava a passagem do conhecimento (gnosis) para o amor (agape) a Deus, sempre transcendente. Se, na vida eterna, a busca de Deus como “objeto” cessa, o dinamismo do amor permanece. Incessante, sempre mais ardente e insaciável, no desejo de estar na unidade com Deus, o amor cresce indefinidamente por toda a eternidade (H. Musurillo, De vita Moysis (1964), pp.219-220).
A união com Deus, descrita por S. Gregório como um movimento de saída de si mesmo, é reelaborada pelo filósofo e místico alemão, Mestre Eckart (1260-1327), que dá um passo adiante. Para evitar toda dualidade, ele afirma que “Deus é pureza”; “que Ele se destaca de tudo”. Assim, mesmo nos assemelhando a Deus, “unindo-nos” a Ele, Ele não só é sempre transcendente, mas também distinto de nós: superior ao amor, a unidade só é possível no esvaziamento de si mesmo, por um salto ou grito de entrega; é o “nascer em Deus” (Pr 39, DW 2, pp. 265,1-266, Stuttgart 1936).  
Esse modo novo e decisivo de chegar à unidade manifestou-se, plenamente, na hora em que Jesus transcende os acontecimentos do Calvário... Esvaziado de si mesmo, no abandono total, diz Ele: “Pai, porque me abandonastes ?”... Eis que na Luz vinda do alto, Ele “ressurge em Deus”: “Em vossas mãos entrego o meu espírito”.
Jesus, em perfeita unidade com o Pai, é o caminho da humanidade na abertura incondicional para Deus, o Inominável. Nele, o ser humano, graças à mediação de sua liberdade e à ação do Espírito Santo, participa da comunhão com Deus, movimento designado, na literatura antiga, pelo termo “deificação”, mais tarde, “adoção filial”.    
      Amor e amizade! S. Agostinho, herdeiro da antiga tradição filosófica e literária, traça dois tipos de amizade: uma simplesmente natural, ligada à convivência e ao relacionamento social e profissional. Embora pareça superficial, a perda daquele com quem conversávamos e nos relacionávamos nos faz sofrer. Há também a amizade que não depende da convivência ou da familiaridade, “unindo duas pessoas, graças à confiança e à benevolência”. Estas e outras expressões de amizade mostram que se pode ir além do condicionamento de temperamento, de caráter e do ambiente psicossocial para amar o outro: é a amizade espiritual, pela qual se ama o outro em vista de Deus e, no outro, ama o próprio Deus.
Eis a dignidade da pessoa, criada à imagem e semelhança de Deus, que, no nível divino do amor, encontra o autêntico lugar de unidade interior, em sua relação única e irrepetível com Deus!  



†Dom Fernando Antônio Figueiredo, OFM

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