Diocese de Santo Amaro - 30 anos - Criação




Criação da Diocese de Santo Amaro


    Segundo o cânon 373 do Direito Canônico, é direito exclusivo da suprema autoridade da Igreja erigir Igrejas particulares.
 Normalmente, em nossos dias, para a criação de uma de nova circunscrição eclesiástica, supõe-se o pedido exarado por uma determinada Diocese, com o assentimento da Província Eclesiástica correspondente.
 Por conseguinte, sua criação não é um fato desconhecido e independente do parecer das demais Dioceses da respectiva região episcopal.
  1. Criação das quatro novas Dioceses, desmembradas da Arquidiocese de S. Paulo
Para a criação das quatro novas Dioceses, desmembradas da Arquidiocese de S. Paulo: S. Miguel Paulista, Osasco, Campo Limpo e Santo Amaro, seguiu-se o processo acima descrito, porém, precedido por uma moção feita pelo Arcebispo metropolitano.
Anteriormente, Dom Paulo Evaristo Arns, Arcebispo da Arquidiocese de S. Paulo, fizera um pedido a Roma, bastante inusitado para os nossos dias. Solicitou à Santa Sé a criação de oito novas Dioceses, que corresponderiam, precisamente, às oito regiões episcopais, que, na época, compunham a Arquidiocese.
De acordo com o projeto apresentado, tais Dioceses, embora gozassem de relativa liberdade, no tocante à organização pastoral e econômica, estariam subordinadas, juridicamente, a um governo central.
Em Roma, o pedido soou de modo estranho, pois a Arquidiocese passaria a assumir a figura de um Patriarcado, atualmente, não mais contemplado pelo Direito Canônico vigente.
Na mesma época, é bom recordar, um pedido semelhante, feito pelo cardeal Jean-Marie Fustiger, Arcebispo de Paris, tinha sido negado.
A criação se deu em meados do mês de março de 1989, mais precisamente no dia 15. Em vez de oito, o Papa João Paulo II criou quatro novas Dioceses, ligadas, direta e juridicamente, a Roma. Evidentemente, cada uma delas constituiria, segundo as normas canônicas, uma circunscrição eclesiástica própria, sob a jurisdição de um Bispo, relacionado aos demais Bispos pelo vínculo da unidade e da comunhão eclesial.

Cân. 369 — “A diocese é a porção do povo de Deus que é confiada ao Bispo para ser apascentada com a cooperação do presbitério, de tal modo que, aderindo ao seu pastor e por este congregada no Espírito Santo, mediante o Evangelho e a Eucaristia, constitua a Igreja particular, onde verdadeiramente se encontra e atua a Igreja de Cristo una, santa, católica e apostólica”.

Nesse contexto, destaco a diferença existente entre o atual Direito Canônico e o anterior de 1917. O Código de 19l7 se inscrevia numa concepção eclesial individualista, assinalada pelo título: “A respeito das pessoas”, enquanto o atual Código Canônico, de 1983, tem, diferentemente, como ponto de partida, a realidade comunitária eclesial, designada pelo título: “Povo de Deus”.

No novo Código, não se trata de expor “o direito das pessoas consideradas, individualmente, sob o aspecto puramente jurídico”, mas o direito delas “como membros do Povo de Deus”.
  1. Unidade eclesiástica e expressões diversas da fé


Em sua realidade religiosa e espiritual, a Diocese é uma das expressões do mistério da Igreja, definida, por S. Cipriano, como koinonia, ou seja, sinal sacramental da comunhão do Pai com o Filho, na unidade do Espírito Santo. Eis o sentido intrínseco, ontológico, da Igreja e, portanto, da Diocese!

Essa unidade fundamental é concretizada pela Diocese através de suas atividades pastorais, pelo estilo de vida dos seus membros e pelas múltiplas expressões religiosas, que a tornam visível ao mundo e à sociedade. Nesse sentido, ela não é uma realidade estática, mas essencialmente dinâmica.

Portanto, desde os primeiros anos, mais do que afirmar ser ela católica, pressuposto fundamental e irrenunciável, era necessário que a Diocese de S. Amaro fosse sinal e presença de comunhão e de unidade. Atributos que não se limitam a uma afinidade de pensamento ou afeto de amizade, mas que exigem uma fé comum, abraçada por todos, penetrando e orientando suas diretrizes, atividades e, especialmente, a sua “missão de anunciar o Reino de Cristo e de Deus e de estabelecê-lo em todos os povos”.

Embora, essa unidade só tenha sua realização plena na glória celeste, tínhamos consciência de que ela não seria, necessariamente, rompida pela diversidade de opiniões e maneiras diferentes de expressar a fé. A unidade, dom precioso a ser preservado a todo custo, não pode jamais ser compreendida como uniformidade.

  1. Como manter a unidade e a identidade diocesana, através da diversidade de expressões?


O desafio era enorme. A sociedade encontrava-se em ebulição, numa constante transformação, marcada por diferenças culturais, sociais, religiosas, num mundo pluralista.

Com a missão de levar a todos a mensagem da misericórdia e da esperança, a recém-criada Diocese, em suas múltiplas atividades pastorais, não poderia deixar de preservar as características próprias da região em que se encontrava – a região sul da cidade de S. Paulo, hoje, com mais de três milhões de habitantes.

Porém, assim como as três outras Dioceses, ela corria o risco de ser absorvida, principalmente, pela Arquidiocese, com sua estrutura eclesial sólida e centralizadora. Era necessário alcançar uma identidade própria.
Tendo em vista esse objetivo, envidamos esforços para formar um laicato consciente e empenhado, que vivesse, ao mesmo tempo, uma relação de similitude, isto é, de comunhão, e uma relação de dessemelhança, capaz de expressar, com fidelidade, a realidade religiosa própria de cada região e de cada paróquia.

O ideal era grandioso e entusiasmante: alcançar, graças ao Espírito Santo, sua identidade específica, sem deixar de ser presença e sinal de unidade. As trocas de ideias e os debates não deixaram de ser calorosos. Iluminavam-nos as palavras de S. Irineu: “A diversidade de ritos e de formulações doutrinárias, não diminue; ao contrário, confirma e solidifica a unidade na fé”.

4. Apelo evangelizador da Igreja


O apelo evangelizador atinge o Povo de Deus: Bispo, Presbíteros, religiosos e leigos, exigindo de todos fidelidade e empenho, sempre maiores, à sua vocação. Fazia-se necessário lançar-se na ingente tarefa de anunciar a mensagem da salvação e manter a integridade dos costumes, em todos os quadrantes do populoso território diocesano.
No desejo de efetivar tal ideal, foram ampliadas as paróquias existentes: criaram-se novas paróquias e comunidades, de 34 para 112 paróquias e de 63 para 109 comunidades; multiplicaram-se as atividades pastorais e, no poder generoso do Senhor, de 40 padres passamos a contar com a atuação de mais de 210 Padres, ardorosos missionários, que levam a Palavra de Deus não só a outras regiões do Brasil, como o Amazonas e Mato Grosso, como também reforçam a ação apostólica realizada por irmãos presbíteros, principalmente, na França, Itália e Portugal.
Igualmente, foram criados diversos Institutos Religiosos, de homens e mulheres, consagrados a Deus, que, suscitados pelo Espírito Santo, dedicam-se ao serviço da ação missionária da Igreja, à qual estão estreitamente ligados, em conformidade com a natureza de seus Institutos.

5. Os bens materiais


Ao criar uma Diocese, deve-se dotá-la dos bens temporais necessários à realização de seus fins específicos: a sustentação de sua estrutura evangelizadora e formadora, particularmente, do clero, compreendendo o seminário, instituição destinada à preparação de futuros sacerdotes.

Era indubitável a consciência de um necessário lastro econômico no que tange às quatro Dioceses, desmembradas da Arquidiocese. Deve-se dizer que houve uma real preocupação por parte do Arcebispo: a questão era como concretizá-lo.

Durante quase um ano, realizaram-se infindáveis reuniões, com desgaste de ambas as partes. O responsável, nomeado pelo Arcebispo, para discutir em nome da Arquidiocese, foi um dos Bispos auxiliares. Muitas hipóteses foram levantadas, sem chegar, no entanto, a uma conclusão, que satisfizesse às diversas partes.

Após, praticamente, um ano de encontros e desencontros, o Bispo auxiliar nos apresentou uma lista de pequenas propriedades da Arquidiocese, que constituiriam o patrimônio raiz das novas Dioceses.

Lembro-me bem da lista que nos foi apresentada. Desconhecendo a realidade concreta do montante rentável, pedimos um relatório resumido, para vermos o quanto elas significavam, mensalmente. Como o resultado era mais do que insuficiente para a manutenção das quatro Dioceses, nossas tratativas se estenderam.

Finalmente, por sugestão de D. Francisco Vieira, Bispo de Osasco, anteriormente Bispo auxiliar da Arquidiocese, foi indicado, como possível patrimônio raiz das Dioceses, o Cemitério do Getsêmani. Embora, ele não apresentasse um superávit significativo, mas, tendo em vista o fato de podermos melhorar os seus rendimentos, aceitamos tal possibilidade. Posteriormente, com a devida aquiescência de D. Paulo Evaristo Arns, ele passou a fazer parte do patrimônio rentável das quatro Dioceses.

6. Algumas questões particulares


Ao me referir à realidade econômica da Diocese, desejo responder a uma pergunta, bastante significativa, que me foi feita, em outra ocasião.

Perguntaram-me: “Uma vez que a Diocese de S. Amaro não tinha o necessário rendimento para manter suas obrigações normais, como, então, teríamos adquirido os terrenos para as futuras paróquias?”.

Aproveito o ensejo para recordar a figura de três pessoas, que se confundem com as belas imagens de nossa Diocese: Fr. Pedro Amendt, Sr. August Arnold e Fr. Antônio Moser, ofm.

Frei Peter Amendt, ofm., franciscano, alemão. Eu o conheci quando estive com D. Quirino Schmidt, Bispo de Teófilo Otoni, na Missionszentrale der Franziskaner, com sede em Bonn. Como secretário, ele me fez conhecer as dependências da Instituição, explicando-me suas diversas atividades. Tornamo-nos amigos.

Mais tarde, já Bispo de Santo Amaro, fui à Alemanha, com Fr. Antônio Moser, ofm, para apresentar àquela Instituição o projeto da futura Cúria diocesana. Para minha surpresa, Fr. Peter tinha sido escolhido como responsável pelas obras franciscanas do sul do Brasil. Senti, então, quão benevolente era o carinho de Nossa Senhora de Fátima pela nossa Diocese!

Ele não só se prontificou a apresentar o projeto à comissão dos Superiores franciscanos alemães, mas também se dispôs a vir ao Brasil para conhecer, de perto, nossa realidade. Vendo a precariedade da residência episcopal, juntos, esboçamos o projeto para a construção de uma nova residência, ao lado da Cúria. Em suma, os franciscanos alemães assumiram e concretizaram a edificação da Cúria e da residência episcopal.

Ao término das obras, comuniquei-me com a Alemanha para agradecer a todos. Fui surpreendido com a notícia de que ele acabara de ser transferido para cuidar das obras franciscanas da África. Permanecera no Departamento do Brasil, justamente, o tempo necessário para atender às primeiras necessidades de nossa Diocese. Só pude, então, com S. Francisco, exclamar: “Louvado seja meu Senhor!”.

A segunda figura providencial foi a de um leigo, também alemão, Sr. August Arnold. Na pequena cidade de Biberach, situada ao sul da Alemanha, ele desenvolveu um singelo e eficaz trabalho voluntário, em benefício das obras franciscanas no Brasil.

Percorria a cidade, recolhendo roupas seminovas, que, compactadas em fardos, eram enviadas à Diocese, através de grandes containers.

Alguns destes fardos foram entregues, conforme nossas possibilidades, a uma paróquia ou ao seminário. A maior parte, porém, ia, diretamente, para Petrópolis, onde Fr. Antônio Moser mantinha um trabalho comunitário bem organizado. O resultado da venda era dividido em duas partes: uma para as obras sociais dos franciscanos de Petrópolis, outra para a Diocese de S. Amaro.

Como exemplo, cito o terreno da paróquia Nossa Senhora de Fátima. Adquirido mediante empréstimo, concedido pelo ecônomo da Província Franciscana, Fr. Carlos Körber, ofm, posteriormente, foi ressarcido, graças ao resultado daqueles bazares.

A esse relato, acrescento o que foi exposto, anteriormente, a respeito dos primeiros momentos da criação de nossa Diocese.

No tocante aos seminários, trago à nossa memória a pessoa do Sr. Gaspar Bettencourt, cubano, que, em 1990, me procurou, desejoso de adquirir um terreno, contiguo à antiga paróquia do Verbo Divino. A negociação se concretizou mediante uma permuta.

Pelo terreno, cedido por nós, ele construiu a nova Igreja do Verbo Divino e entregou-nos um terreno, onde edificou, sob nossa supervisão, o Seminário de Filosofia; terminou a construção da paróquia Sagrada Família e, vizinho à paróquia, passou à Diocese um terreno com a edificação de seu centro catequético.

O Seminário de Teologia e o Instituto S. Boaventura, junto à paróquia Nossa Senhora da Esperança, na Cidade Dutra, foram construídos graças à doação feita por Pe. Marcelo Rossi, com o resultado da venda do primeiro e segundo CDs.

Esses primeiros árduos momentos permanecem em nossa memória e os que deles participaram, com dedicação, desprendimento e muito amor, são lembrados em nossas orações.



7. Organização diocesana


Nos dois primeiros anos, a Diocese foi se organizando em seus diversos organismos:
  1. Consultivos colegiais como Conselho de Presbíteros; o Colégio dos Consultores; e o Conselho pastoral e administrativo.
  2. Erigiram-se a Chancelaria, o Economato...

No segundo ou terceiro ano da criação da Diocese, com a inspiração e auxílio dos franciscanos da Província de S. Paulo, iniciaram-se duas atividades em benefício do seminário: o pró-vocacional e a feira vocacional.

O objetivo das pessoas e dos colegiados, compreendidos nestes organismos, era dinamizar a Diocese; subvencionar as necessidades da Igreja, promover a justiça social, a partilha mútua e atender, eficazmente, os fiéis.

Para melhor evangelizar a vasta área territorial da Diocese e promover a união dos Padres e demais agentes responsáveis da ação evangelizadora, criamos 11 Setores Pastorais e 11 Foranias.

Inscrita no destino histórico, que nos foi legado, a Diocese de Santo Amaro deseja se realizar, autenticamente, como ação do Cristo e da Igreja, em sua ação profética e santificadora. O objetivo primário das ações evangelizadoras e da organização diocesana sempre foi o de favorecer o nascimento, a expressão e o crescimento, sempre mais intenso, da comunhão e da unidade.

+D. Fernando Antônio Figueiredo, ofm.
Bispo emérito de Santo Amaro

Comentários

  1. Quero dizer que Dom Fernando Figueiredo, fez um belo trabalho durante seu mandato como Bispo diocesano na nossa diocese de Santo Amaro, quero parabenizar ele por tudo que fez por nós, moradores da região de Santo Amaro.

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