Reflexão do Evangelho - Segunda-feira, 24 de abril


Jo, 3, 1-8 - Encontro com Nicodemos (I)




         As palavras de Jesus deixavam uma impressão bastante forte em todos os que o ouviam. Um deles foi Nicodemos, membro do Sinédrio, que o procura, na calada da noite, às escondidas, querendo evitar as críticas e talvez as chacotas de seus colegas. Mesmo reconhecendo a Lei como fonte de vida e de santidade, ele substituía o espírito da Lei por seu sistema de normas e prescrições, impondo-o ao povo como caminho para alcançar a salvação escatológica. Jesus queria preservar seus discípulos deste perigo. Por isso, Ele destaca que a intenção “escondida”, o verdadeiro sentido santificador e transformador da Lei é o mandamento do amor a Deus e ao próximo, que exige conversão interior e uma prática concreta de vida, em que tudo é feito na atmosfera do Espírito de liberdade.
 Vendo em Jesus um novo sentido para a vida, Nicodemos o saúda, solenemente: “Rabi, sabemos que vens da parte de Deus, como um mestre, pois ninguém pode fazer os sinais que fazes se Deus não estiver com ele”. Cheio de carinho e compaixão por ele, Jesus compreende o que se passava em seu coração, e leva-o a refletir: “Em verdade, te digo: quem não nascer do alto não pode ver o Reino de Deus”.  Seu interesse não é criar uma nova religião, mas o homem novo, animado pela caridade e pela misericórdia. Nicodemos, surpreso pela inesperada e imediata reação de Jesus, defende-se com uma pergunta evasiva: “Nascer de novo, como pode isto acontecer? ”.
Vamos pensar um pouco mais, e veremos a necessidade de um novo “nascimento”, que é viver segundo o Espírito divino, cuja consequência é a liberdade não só para si, mas para todos. É fantástico! É como se o Mestre lhe estivesse dizendo: “Não desanimes, evita que o teu coração permaneça inquieto e confuso”! Nicodemos ainda não compreendera que o amor exige integridade de vida, e que a essência da crítica de Jesus era, justamente, a ruptura entre vida e doutrina. Bem. Com o coração cinzento de uma manhã de inverno, Nicodemos retruca: “Pode alguém voltar ao seio de sua mãe e nascer de novo? ”. Com certa dose de ironia, Jesus lhe pergunta: “Tu, mestre em Israel, e não sabes essas coisas? ”. E, como um amigo muito compreensivo, acrescenta: “Quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no Reino de Deus. O que nasceu da carne é carne, o que nasceu do Espírito é espírito. Não te admires de eu te haver dito: deves nascer do alto”. Nicodemos se sente desafiado.
 O Mestre reconhece as dificuldades de Nicodemos para sair de um mundo casuístico, preso às práticas exteriores da Lei. Talvez, ele não tivesse ainda enfrentado, para valer, semelhante combate interior. Esse encontro tornou-se, então, condição essencial para ele abandonar o sonambulismo cotidiano e livrar-se das areias, que encobriam, em sua alma, a fonte de água viva. Enfim, quase num último esforço, Jesus utiliza a imagem do vento, “sopra e vai onde quer”, para sugerir a liberdade do Espírito. Certo, certíssimo, observar a Lei é viver a misericórdia divina, é excluir toda tentativa de identificar Deus ao sistema de práticas rituais e prescrições cultuais. Comovido, Nicodemos vê suas dúvidas se dissiparem e efetivar seu nascimento para uma vida nova: agindo retamente, com coração grande, e, pelo amor, fazendo-se servo de tudo e de todos.


+Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm

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