Carta Pastoral - Em busca de uma vida sem pecado
Carta Pastoral
- Em busca de uma vida sem pecado
Páscoa de 2013
Após algum tempo, volto a dirigir a
todos os diocesanos uma Carta Pastoral, que é própria do bispo e que tem por
finalidade ensinar e orientar.
No
início da vida cristã, a grande preocupação era a difusão da mensagem
evangélica e a orientação das consciências dos que se convertiam à fé. Todo o
esforço era feito no sentido de que eles se afastassem do pecado e pautassem
suas vidas segundo os ensinamentos de Jesus. Nos Atos dos Apóstolos,
encontramos o reconhecimento por parte dos Apóstolos do poder que o Senhor lhes
tinha concedido de ligar e desligar, de reter e perdoar os pecados. É o caso da
fraude de Ananias e Safira, colocados diante do Apóstolo Pedro.
São
também claras as admoestações de S. Paulo contra os idólatras, adúlteros,
avarentos, ladrões, blasfemadores, aos quais os cristãos de Corinto pertenciam
antes de sua conversão (1Cor 5,9-11). Reflete-se nas cartas paulinas a
convicção de que a Igreja não é só santa, mas nela há também pecados a serem
perdoados. Alguns pecadores impenitentes são tratados com certa dureza, outros
chegam a ser desligados da comunhão da Igreja.
Se
os Apóstolos falam do pecado, não deixam de acentuar o perdão divino. “Se
alguém pecar, temos um advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo. Ele é a
propiciação por nossos pecados” (1Jo 2,1-2). “Se confessamos nossos pecados,
fiel e justo é Deus para nos perdoar e nos purificar de toda iniqüidade”(1Jo
1,9). Estabelece-se a distinção entre os que não se reconhecem pecadores e os
que, reconhecendo-se pecadores, se entregam à misericórdia de Deus no desejo de
viverem “na luz”.
O
sacramento da Penitência, realidade presente na Igreja e instituída por Cristo,
vai se estruturando no passar dos tempos. No final do primeiro século e início
do segundo, S. Clemente de Roma e S. Inácio de Antioquia destacam a função dos
ministros como representantes da comunidade, os quais na “imitação” de Cristo,
diríamos hoje, na pessoa de Jesus, concedem o perdão. Fundado nos escritos de
S. João Evangelista, Orígenes acentua a distinção entre os peados, indicando
que nem todos conduzem à morte. Há os que destroem a vida do batismo, enquanto
outros não. Ele denomina os primeiros de “pecados que causam a morte” e os
últimos, de “pecados que não causam a morte”, seriam os pecados mortais e os
pecados veniais. Entre os pecados que conduzem à morte ele cita o adultério, o
homicídio, a fornicação, a avareza e a idolatria.
O
ministro da penitência e do perdão foi apontado sempre como sendo o bispo e
seus colaboradores, os padres. Escreve Orígenes: “Quando os que exercem a
função de bispo ou presbítero utilizam a Palavra como Pedro e, tendo recebido
do Salvador as chaves do Reino dos céus, ensinam que tudo o que eles desligam,
isto é, o que eles perdoam, é também desligado nos céus”.
O
rito de reconciliação compreende a imposição das mãos acompanhada de oração. A
comunidade também participa rezando pelo penitente. Há, por vezes, a idéia de
uma unção que estaria manifestando a doação do Espírito Santo, pois não se pode
esquecer que o pecado mortal é para a Igreja um fechar-se do homem ao Espírito
de Deus.
Reconciliação
pressupõe distanciamento, ofensa e o reatamento de uma relação de amizade,
sobretudo, entre Deus e o homem, interrompida pelo pecado. Em nossa vida
apostólica, enfrentamos contratempos e dificuldades. Faltam-nos serenidade e
paz. Resvalamos em alguns erros e,
mesmo, no pecado. Vem-nos a pergunta: Será que temos inimigos? Quais são eles?
Espontaneamente
dizemos que não é o povo, que nos acolhe com carinho. Menos ainda nossos irmãos
na fé. Então, quem é o nosso inimigo? Um poder pessoal extrínseco a nós? Nosso
grande inimigo somos nós mesmos, quando alimentamos em nosso coração o orgulho,
a ganância e o egoísmo, que os monges do deserto denominavam “o trio maléfico”.
Sob seu domínio nosso olhar interior torna-se turvo e nosso relacionamento com
o Bispo, com os irmãos no sacerdócio, na vida religiosa e na comunidade cristã,
fica distorcido e, por vezes, hipócrita. Tiremos a trave de nosso olho e
ouçamos as palavras do Senhor: “Não julgueis para serdes julgados!”.
Hoje,
o sacramento da Confissão é para nós um convite, convite para abrir-nos à
misericórdia de Deus e reconhecer Cristo como aquele que “tira o pecado do
mundo”. A serenidade e a paz reinarão em nosso coração, pois somos chamados à
santidade e pecando, somos convocados a receber o perdão sacramental e sermos
reintegrados na vida de Deus.
Somos ministros
da misericórdia não só os sacerdotes por serem ministros do sacramento da
confissão, mas também todos os cristãos. Por nossa vida, em seus mínimos atos, proclamamos
a misericórdia divina. Calem-se as palavras, sejamos nós presença da
misericórdia em todo relacionamento humano, principalmente, no convívio com os
irmãos e irmãs.
Na fé, uma
certeza nos anima. A vitória final não é a do orgulho e a do desejo de poder,
mas a vitória é a de Jesus Ressuscitado. Acolhemos a lição dada por Ele, na
Santa Ceia, ao instituir a Eucaristia. Como é duplo o mandamento do amor, a Deus
e ao próximo, a Eucaristia, sua presença real e consubstancial, não nos
dispensa do lava-pés, do serviço aos nossos semelhantes. A vela da noite de
Páscoa fala-nos que a verdadeira luz brilha, graças ao Espírito Santo, em
nossos corações no amor generoso, despretensioso e dadivoso. Um lema se impõe: “Servir
e não ser servido”. Uma atitude, a ser assumida por nós, traduz-se nas
palavras: “Até agora, nada fizemos, comecemos tudo de novo”. A nova vida de
Jesus Ressuscitado está presente em nós. “Ontem, crucificado com Cristo, hoje,
glorificado com Ele” (S. Gregório de Nazianzo).
FELIZ E
ABENÇOADA PÁSCOA!
D. Fernando A. Figueiredo
Bispo de S. Amaro - SP
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