Reflexão do Evangelho de sábado 27 de agosto
Reflexão do Evangelho de sábado 27 de agosto
Mt 25,14-30 - Parábola dos talentos
Jerusalém está bem próxima. Jesus já antevê a cruz como o serviço
supremo a ser realizado por Ele para a salvação da humanidade. Nessa situação
de expectativa, compreende-se o fato de os discípulos pensarem que o Reino de
Deus ia se manifestar imediatamente. Por isso, visando arrefecer o entusiasmo
pela instauração próxima do Reino, Jesus lhes conta a parábola dos talentos.
Um homem, de nobre origem, viaja para longe e distribui a dez de
seus servos uma quantidade de bens materiais ou, no dizer bíblico, alguns
talentos, que eles deverão restituir com lucro. A confiança depositada neles é
grande, pois eles poderiam usar seu dinheiro como bem entendessem. Alguns são fiéis
e multiplicam o que receberam, obtendo a devida recompensa. Mas um deles, que
os guardou embrulhados num lenço e nada lucrou, tem como punição a
transferência, até do que lhe tinha sido entregue, aos servidores fiéis.
Segundo a parábola, cabe a cada um a responsabilidade de
produzir mais ou perder tudo. Em termos espirituais, ou o discípulo avança em
direção a Deus ou retrocede, pois a vida espiritual é compreendida como um
combate incessante, denominado “luta invisível”, em que o fato de não produzir
torna-se uma regressão. Os dons recebidos, sem ofuscar a beleza da mensagem
evangélica, fecundam a vida humana em seu ser e agir, pois, sem destruir a
liberdade, eles aperfeiçoam o ser humano, permitindo-lhe tornar-se mais plenamente
ele mesmo por seu próprio esforço. S. Boaventura observa: “O dom de Deus, se
ele for acolhido, torna o homem mestre dele e do universo. A criação não será um
oceano de passividade. Ela é Deus infinitamente fecundo, engendrando filhos,
que conduzem a Ele a criação inteira e a humanidade; não meras pedras
inanimadas, mas membros vivos” (Étienne Gilson).
Esse crescimento ou ascensão, que converge para a grandeza
indizível da vida em Deus, é gradual, e pressupõe construir, constantemente,
sobre os talentos recebidos. O ponto de partida é a visão realista de si mesmo,
pois, segundo S. Isaac, “aquele que conhece a si mesmo é maior do que aquele
que viu os anjos”, e o princípio-chave, que o orienta, se expressa na fórmula: “Gratia
supponit et perficit naturam”, que implica uma experiência direta do Criador,
pois aperfeiçoada pela graça, a natureza cruza o portal da esperança para
participar da comunhão com Deus. Natureza e graça não se opõem, nem se
justapõem, mas é, justamente, pelo dom da graça que a natureza atinge a sua
perfeição: efetivamente, restaurado por Cristo, o ser humano vive a “amizade
com Deus”.
Dom Fernando Antônio Figueiredo, OFM
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