Reflexão do evangelho - Terça-feira, 14 de março


Mt 23, 1-12 - Hipocrisia, vaidade dos fariseus?


        No tempo de Jesus, as autoridades religiosas, mais precisamente, alguns fariseus, sentavam-se na “cátedra de Moisés”, no desejo de serem reconhecidos e exaltados pelo povo, como cumpridores do ideal do judeu observante. No entanto, pelo fato de não colocarem em prática o que ensinavam, a verdadeira intenção das leis divinas era ofuscada, ao invés, eram ressaltados as normas e regulamentos humanos, que constituíam, segundo as palavras de Jesus, “pesados fardos, colocados sob os ombros do povo”. O procedimento de Jesus era bem diverso, seus ensinamentos refletiam compreensão, simplicidade e ternura pelos mais humildes, o que provocava forte reação, da parte dos fariseus, que consideravam sua atuação como sendo “contra a Lei”. Jesus não se sente intimidado. Porém, evitando resvalar numa religião de “ópio”, que tivesse por objetivo amortecer o sofrimento e a humilhação dos pequenos com falsas promessas, Ele quer libertar seus ouvintes da ideia de um Deus “déspota”, pronto a escravizar e tolher a alegria de se viver bem.  
        Por isso, após ter confundido os herodianos, saduceus e escribas, Ele se dirige aos fariseus, que buscavam a santidade e a pureza de Israel, de acordo com as exigências de Deus. Eles julgavam cumpri-las sendo rigorosos e tradicionalistas intérpretes das mínimas prescrições da Lei.  Jesus, também buscando a santidade e a pureza, fala do perdão e do amor misericordioso, que abrange a humanidade toda inteira. Por isso, ao dizer: “Ai de vós, fariseus, sábios e guias espirituais! Hipócritas! ”, a multidão e os discípulos o escutavam com prazer. Se a piedade deles se ligava à Lei, que era situada entre Deus e o povo, a de Jesus consistia em conduzir seus ouvintes a um relacionamento direto e pessoal com o Pai, Deus das misericórdias. E deixando explícita a sua intenção, Ele os alerta sobre o perigo de que a mera observância exterior das prescrições esteja escondendo, sob o manto de uma pureza legal, uma impureza interior; quem vivesse assim, distante do conteúdo da pregação dos profetas, “seria como um sepulcro caiado”.
Por conseguinte, a crítica de Jesus não atinge diretamente a Lei ou as suas prescrições, mas sim a atitude e a mentalidade com que os fariseus as observavam: rigidamente e para serem admirados por todos. Nas palavras de Jesus não existe espaço para o casuísmo, tampouco para os pesados fardos postos nos ombros dos outros; o que vale é a caridade para com todos, pois o amor, que atrai e une, estabelece o Reino de Deus, como a plenitude eterna, já presente em nossa história. Sua voz, mais afiada do que uma espada, é um apelo à conversão (metánoia) e à vivência interior da fé no amor e na comunhão fraterna; urge passar do pecado à virtude, do erro à verdade. Escreve Orígenes: “Os verdadeiros discípulos de Jesus ligam a Lei de Deus à mão, pela prática das boas obras. Jamais fazem dos mandamentos penduricalhos diante dos olhos de sua alma”. Alusão aos fariseus, que escreviam o Decálogo da Lei em finos pergaminhos, levando-os dobrados e atados em suas frontes.


+Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm


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