Reflexão do Evangelho de sexta-feira 20 de maio
Reflexão
do Evangelho de sexta-feira 20 de maio
Mc
10,1-12 - Perguntas sobre o divórcio
Acalorada era a discussão entre os
rabinos sobre o motivo que legitimava o repúdio da própria mulher. A questão
girava ao redor das determinações do Deuteronômio, cujas expressões eram pouco
precisas. Para testar Jesus, os fariseus lhe perguntam: “É lícito repudiar a
própria mulher por qualquer motivo que seja? ”. Os mais rígidos, escola de
Shammai, interpretavam o texto bíblico em seu sentido estrito: só em caso de uma
conduta deveras desonrante. Ou em sentido mais amplo, escola de Hillel, segundo
a qual se podia repudiar a mulher por não importa qual motivo. A pergunta é
capciosa e visa colocar Jesus à prova, no desejo de arrastá-lo para uma contenda.
Ciente do que se passa no coração de seus
ouvintes, o Senhor situa a questão no quadro dos desígnios do Pai. Sem negar a
Lei, é necessário superá-la não se deixando limitar por ela ou pela ideia de
que Moisés aprovava o divórcio. Ele rejeita a casuística judaica e, com
sabedoria, remete os ouvintes ao gesto inicial da criação: o amor de Deus, que
não permite reduzir o matrimônio a ser apenas um meio para gerar filhos. Foi por
amor que “no princípio Deus os fez homem e mulher”, e quando se tornam “uma só
carne” o dom da unidade se perpetua. O Senhor não se reporta ao princípio
temporal, mas sim ao princípio absoluto e eterno de nossa eleição em Deus, que nos
chama a ser perfeita unidade no amor, pois sendo amor, escreve S. Gregório de
Nissa, Deus colocou, desde a criação, esta marca em nosso coração. Portanto,
situado no interior da teologia bíblica da aliança, o matrimônio expressa a
comunhão íntima de vida e de amor entre os cônjuges, elevados ao nível e à
dignidade dos “amigos do Esposo”.
Para além de uma determinada e limitada
situação, o matrimônio exprime a promessa inicial de Deus e o cumprimento
final: a criação, na aurora da vida, e a promessa escatológica, imagem da
integração do fim dos tempos. Assim, unidos pelo “amor, que faz de dois seres
um só”, segundo S. João Crisóstomo, os cônjuges são reenviados à ação
misericordiosa de Deus, que os renova e lhes permite, em caso de queda,
recomeçar o caminho com nova esperança. Nesse sentido, a resposta dada por
Jesus, “o que Deus uniu o homem não separe”, não pode ser reduzida a uma norma
jurídica, mas tida como um princípio fundamental a ser observado pelos esposos.
E não só. O matrimônio, instituição natural, é enobrecido e elevado por Jesus à
dignidade de sacramento, razão pela qual os primeiros cristãos o realizam na Igreja,
diante do seu ministro: “in facie
ecclesiae”, na expressão de S. Inácio de Antioquia em sua Carta a S.
Policarpo.
Instituído
por Deus, o matrimônio e os demais estados de vida têm seu valor reconhecido pela
Igreja e sua própria medida de santidade. Todos participam da vida divina no
coração da vida litúrgica: a celebração eucarística. O ser humano, livre e
responsável pelos seus atos, é capaz de pecar e praticar o mal, mas também de
converter-se e fazer o bem. Por isso, “ao rigorismo de Novaciano, em meados do
século 3º, que propunha uma Igreja perfeita e pura, os Padres apresentam a
Igreja da misericórdia e da condescendência benévola, que tem suas portas
abertas para o pecador arrependido e disposto à conversão”.
Dom Fernando Antônio Figueiredo, OFM
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